Falar sobre a
responsabilidade social da
igreja nos leva a falar
primeiramente sobre a missão
da igreja. Você já parou
para pensar por quê e para
quê existe a igreja? Esta é
uma das perguntas mais
importantes que você pode
fazer a si mesmo(a). A sua
resposta levará a responder
outras perguntas também
importantes: Por que ser
membro de uma igreja? Por
que trabalhar na igreja? Em
que devo investir meu tempo,
bens e recursos?
Geralmente, a missão da
igreja é entendida como
sendo a de “ganhar almas” e
promover o seu próprio
crescimento, buscar a
multiplicação de crentes e
igrejas. E nesta
perspectiva, o envolvimento
social é visto como um
“desvio” da tarefa principal
da igreja, que é a
evangelização. O que você
pensa sobre isto? (Discuta
um pouco com seu grupo).
Existe uma necessidade
urgente de refletirmos
juntos acerca do que
significa ser igreja, no
mundo. Qual o significado e
propósito da nossa própria
existência, como povo de
Deus?
a)
O sentido do Reino de Deus
De forma bem sucinta, vamos
pensar no sentido do Reino
de Deus. Segundo H. Snyder,
o Reino de Deus é acima de
tudo as Boas Novas que Jesus
proclamou. Ele se refere à
maneira como os cristãos
devem viver suas vidas
diárias. Vamos sintetizar o
ensino bíblico do Reino nos
seguintes pontos:
• O Reino é o governo
soberano de Deus sobre todas
as coisas - O Reino de
Deus não se refere tanto a
uma região ou local onde
Deus reina, mas à sua
autoridade soberana sobre
“todas as coisas”, tanto no
céu como na terra, visíveis
e invisíveis; as coisas do
presente e as coisas que hão
de vir. No A.T., Israel
concebia Deus não só como o
Criador de todas as coisas (Gn.1:1;
Sl.29:10; 97:1; 103:19), mas
também como o Rei soberano
sobre todas as nações (Sl.47;
93; 96-99; 145:13). Ele é o
Senhor da História, cujo
domínio está acima do
domínio de todos os homens (Dn
4:17, 25, 32; 5:21).
• Jesus Cristo é a
entrada decisiva do Reino na
história humana - O
Reino de Deus é o Reino “de
nosso Senhor e do seu
Cristo” (Ap.11:15). As Boas
Novas são de que, em Jesus
Cristo, o Reino de Deus se
tornou visível e presente,
em amor e poder, embora
ainda não em sua plenitude (Mt.11:5).
O Reino é o poder de Deus
atuando para libertar as
pessoas do poder de Satanás
(Mt.12:28; Lc.11:20), para
curar (Mc.10:46-52), para
perdoar pecados (Mc.2:1-12).
Seu poder é mostrado
decisivamente na morte e
ressurreição de Jesus
(Cl.1:19,20).
• O Reino de Deus promete
e é uma nova ordem social
- uma humanidade
reconciliada e um meio
ambiente baseados no amor,
na justiça, na santidade, na
paz (Is.32:17). Ele promete
nada menos que a renovação
radical da sociedade, “novos
céus e nova terra, nos quais
habita a justiça”(II Pe.3:13).
Como Paulo diz repetidas
vezes (Ef. 1:9,10; Cl.1:20;
II Co.5:19), o plano de Deus
é “unir”, “reconciliar”. ou
“encabeçar” todas as coisas
em Cristo Jesus.
Basicamente, o Reino
refere-se à reconciliação em
todas as esferas da
existência humana.
O Plano de Deus, então,
inclui a redenção da vida em
todas as suas dimensões.
Neste sentido, o Reino de
Deus é ecológico. Traz tudo
à vista, e se preocupa com
uma harmonia ecológica certa
em toda a vida - tanto em
assuntos do espírito, como
da mente, artes, família,
relações sociais, políticas
e econômicas.
Para refletir:
1) Quais as implicações de
se viver debaixo do senhorio
de Cristo em todas as áreas
da vida (familiar,
profissional, financeira,
etc)? Como podemos encarnar
os valores do Reino
(justiça, amor, bondade,
harmonia) em meio aos
valores deste mundo?
2) Hoje se fala muito na
questão ética em nosso país.
Como cristãos, qual seria a
nossa contribuição na
construção de uma nova ética
(para o trabalho, as
relações familiares,
sociais, econômicas) que
seja orientada pelos valores
do Reino, visando uma
sociedade mais humana e
justa?
b)
A missão integral da igreja
Como a igreja se relaciona
com o propósito do Reino?
Qual o seu papel, a sua
missão? Não podemos entender
a sua missão
independentemente da missão
de Jesus, o Cabeça da
Igreja. Portanto, se Jesus
veio inaugurar o Reino, a
missão da igreja não pode
ser outra senão a
manifestação, ainda que não
plena, do Reino de Deus, em
palavras e obras, no poder
do Espírito Santo.
• Uma chamada dupla à
evangelização e à
responsabilidade social -
Dentro desta visão, a igreja
tem um chamado duplo: 1)
Como agente do Reino, a
igreja é chamada a proclamar
o Senhor Jesus como único
Senhor e Salvador. O cerne
da sua proclamação é o
anúncio de que, por meio da
cruz, há possibilidade de
reconciliação com Deus,
consigo mesmo e com o
próximo. 2) A igreja é
chamada também para realizar
as “boas obras que Deus
preparou de antemão para que
as realize” (Ef. 2:10), pois
para isso foi criada. Fomos
salvos para as boas obras.
Por meio delas, o Reino se
torna historicamente visível
como uma realidade presente.
A esta dimensão tem se
chamado de responsabilidade
social.
Nesta perspectiva do Reino,
a justiça e o testemunho
evangelístico estão
necessariamente ligados, não
podendo desvincular-se um do
outro sem sérios prejuízos
para o cumprimento da
missão. E elas só podem
entender-se à luz do fato de
que Deus entrou na história,
na Pessoa de Cristo, e de
que o poder de Deus está
atuando para restaurar a
totalidade da vida humana.
• O que vem primeiro:
evangelização ou
responsabilidade social?
Esta é uma discussão
polêmica. Não vamos entrar
em toda a discussão aqui,
mas afirmar algumas
questões. Primeiro,
reconhecemos que a
necessidade mais ampla e
mais profunda de todo ser
humano é um encontro pessoal
com Jesus Cristo. O serviço
da evangelização abnegado
figura como a tarefa mais
urgente da igreja. No
entanto, o evangelho é boa
nova do Reino, e o Reino é
domínio de Deus sobre a
totalidade da vida humana.
Cada necessidade humana,
portanto, pode ser usada
pelo Espírito Santo como
ponto de partida para a
manifestação do poder do
Reino.
Onde há necessidade de
perdão, de palavras de
consolo; onde há problema de
alcoolismo, de drogas, de
violência contra a criança,
de desumanização da mulher,
de falta de trabalho, de
abuso dos direitos humanos,
de exploração dos mais
fracos, enfim, onde há
necessidade humana, aí a
igreja tem que atuar.
Na prática, é irrelevante
perguntar o que vem
primeiro. Em cada situação
concreta, as próprias
necessidades provém a
definição das prioridades.
Se evangelização e
responsabilidade social são
consideradas essenciais na
missão, não necessitaremos
de um manual que nos diga o
que vem primeiro e o que vem
depois.
Vale a pena ressaltar aqui
que nem as boas obras e nem
a proclamação são, por si
só, persuasivas aos
não-crentes acerca da
verdade do evangelho. Mesmo
as obras realizadas por
Jesus foram rejeitadas,
muitas vezes. Na verdade,
nem o ver nem o ouvir
necessariamente produzem fé.
Tanto a palavra como a ação
apontam para o Reino, mas
ninguém pode dizer: “Senhor
Jesus!” senão pelo Espírito
de Deus (I Co.12:13)
c)
Os sinais do Reino
A igreja não é o Reino, mas
aponta para o Reino, dá
sinais da sua presença,
hoje. É interessante agora
pensar como a igreja dá
esses sinais do Reino de
Deus. Howard Snyder (1985)
nos dá alguns exemplos, no
seu livro “The Kingdom
Manifesto”:
• Por ser o único corpo
multi-étnico e
multinacional, buscando amar
a Deus e a todos os Homens,
e confessar a Jesus Cristo
como Senhor;
• Por servir como
instrumento para trazer
muitos milhares de pessoas,
diariamente, à fé em Jesus
Cristo, e para dentro da
comunidade cristã;
• Por fortalecer e
reconstruir a sociedade
através da criação de
famílias estáveis,
comunidades cristãs e outras
micro-estruturas da
sociedade;
• Por ser a mais efetiva e
universal agência no mundo
trabalhando para satisfazer
as necessidades humanas,
aliviar o sofrimento,
defender a causa do pobre e
do oprimido, dando uma voz
às aspirações das
“não-pessoas” da sociedade;
• Por permear a sociedade
não-cristã,
progressivamente, com os
valores morais da revelação
cristã;
• Por sustentar a esperança
e a visão de uma ordem
justa, baseada na paz, no
amor e no respeito mútuo,
pela terra e por todos os
seres humanos;
• Por providenciar um
confronto significativo
contra a violência, as
tendências desumanizantes da
sociedade humana e ajudando
a manter a estabilidade
social e política;
• Por preservar a cultura
humana através da educação,
literatura e outros meios
(p. 89)
Quando a igreja, efetiva e
autenticamente, combina seu
testemunho evangelístico e
profético, com uma visão
ampla do Reino, sua vida e
ministério passam a apontar
para a realidade do Reino de
Deus. E não só isso. A
igreja passa a despertar a
esperança pela vinda plena
do Reino, numa sociedade
cada vez mais desesperançada
e que geme por libertação.
Para refletir:
1) Quais são os elementos
importantes para a formação
de um modelo de missão que
integre tanto a
evangelização como a
responsabilidade social?
2) A área de ação tem sido
apontada como uma das áreas
mais fracas entre as igrejas
do Concílio Nikkei. A que
você atribui esta fraca
atuação? Como reverter este
quadro?
3) A partir do que vimos
nesta seção, de que formas
sua igreja tem dado sinais
do Reino? E de que formas
ela tem falhado em sinalizar
a presença do Reino? Como
estas falhas podem ser
trabalhadas?
Fonte:
Manual de Ação Social
Metodista Livre |